Críticas

O casamento de Ali | Quantos clichês você consegue encaixar num filme?

 

No que depender de O casamento de Ali, manda mais clichê que tá pouco! A produção australiana chegou a ser chamada de “a primeira comédia romântica muçulmana da Austrália”, mas não pense que isso seja sinônimo de algum tipo de originalidade. Praticamente todas as situações do filme já são bem familiares ao espectador, só que agora elas têm turbantes e hijabs.

O casamento de Ali começa com uma cena inusitada para o mundo real mas não para a ficção: uma perseguição a um jovem muçulmano fugindo dos policiais em um trator porque ele precisa chegar ao aeroporto. Corridas desesperadas ao aeroporto são o suprassumo do clichê das comédias românticas, a esperança aqui é que o roteiro se livrasse disso logo no começo em vez de deixar isso para o final, mas não, o filme volta algumas semanas para explicar como que o protagonista chegou àquela situação. Suspiro.

Ali (Osamah Sami) é um jovem iraquiano que vive em Melbourne após sua família fugir do regime de Saddam Hussein. Para orgulhar a família, ele presta vestibular para a faculdade de medicina mas não passa. Ao ver que o filho do rival de seu pai na mesquita passa com nota alta, ele mente e conta pra todo mundo que tirou uma nota ainda mais alta. Paralelamente, ele tem uma quedinha por Dianne (Helana Sawires), que é nascida na Austrália mas de origem libanesa e que também entrou para a faculdade de medicina (mesmo a mesquita sendo meio contra mulheres estudarem).

A mentira de Ali desencadeia mais um monte de desentendimentos, inclusive o de um casamento arranjado que ele sem querer concordou durante a misteriosa cerimônia do chá. É só uma questão de tempo até o seu segredo ser descoberto e ele trazer desgraça para si, para sua família e até mesmo para Dianne.

 

 

O filme, é claro, se sustenta nas situações em que o segredo de Ali quase é descoberto, mesmo o espectador sabendo que isso eventualmente vai acontecer. Além dos inúmeros clichês, como o romance proibido, a mentira de perna curta, a decepção da mocinha e a inevitável carta lida em voz alta, o filme também traz uma representação desconfortavelmente estereotipada da cultura muçulmana.

Enquanto eu entenda a tentativa do filme em mostrar que a comunidade muçulmana não é homogênea e que entre eles há muito preconceito entre iraquianos, libaneses e egípcios, por exemplo, não há uma imersão rica e respeitosa desta cultura. Praticamente todo estereótipo que nós conhecemos está lá: mulheres não têm vez, todos os filhos são pressionados a se tornarem médicos para orgulhar a família, casamentos arranjados e até mesmo o medo dos norte-americanos de terrorismo. Até mesmo a novela O Clone conseguiu mostrar uma abordagem mais interessante.

Embora a história, segundo o próprio filme diz, seja autobiográfica do próprio ator que interpreta Ali, dá pra perceber que a maioria das situações ganham bastante liberdade narrativa para se tornarem ainda mais absurdas. Sabe quando um comediante conta uma história em um show de stand up? O filme todo se parece com isso.

Pra não dizer que tudo aqui está perdido, o filme consegue criar algumas situações engraçadinhas, principalmente nas situações que dizem respeito à comunidade da mesquita. Pra ter uma ideia, o pai de Ali, que é o clérigo local, inventa de criar uma peça cômica sobre Saddam Hussein, protagonizada pelo próprio Ali. Não sei se era pra ser uma homenagem ao musical Primavera para Hitler, mas eu teria achado bem mais interessante um filme sobre isso do que todo esse rolo de mentir a nota do vestibular e correr atrás de um romance proibido. Teria sido um pouco mais original, pelo menos.

Em termos de direção e elenco não há muitos destaques, até porque a maior parte da ação se concentra em Osamah Sami, que está operante. Helena Sawires está um pouco melhor e a maioria dos coadjuvantes se encaixa nos arquétipos do que é esperado deles.

É uma pena que um filme com tanto potencial e oportunidades de entregar algo diferente em termos de comédia romântica tenha se acomodado em tantos clichês do gênero. Com uma fórmula batida e um protagonista pouco carismático, fica fácil declinar o convite para este casamento.

Nota:

Trailer de O casamento de Ali

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Imagens: Matchbox Pictures