A esposa | Glenn Close brilha em história dolorosamente familiar

    A esposa

    É bem possível que ao assistir a A esposa você tenha a sensação de já ter visto este filme antes, mesmo sem ter lido o livro de Meg Wolitzer no qual o filme se baseou. Mas infelizmente a sensação de familiaridade não vem apenas de obras de ficção, mas da realidade que ainda é tão constante na vida de muitas mulheres.

    Joan Castleman (Glenn Close) é a esposa do renomado escritor Joe Castleman (Jonathan Pryce), que será agraciado com o Nobel de Literatura. Só que este episódio funciona quase como uma gota d’água para a protagonista que, além de ter passado por diversas traições do marido, é a única razão do sucesso dele.

    A esposa

    Pela própria expressão de Joan nós já sabemos que há uma felicidade contida no sucesso do marido e não demora muito a entendermos por quê. Por meio de flashbacks o filme nos conta um pouco sobre a história do casal: de como Joe abandonou a primeira esposa para ficar com Joan, fascinado pelo talento literário dela e de como ela foi responsável por casa conquista do marido. Ela não apenas indicou o manuscrito de Joe a um grupo de editores, como praticamente reescreveu o trabalho para que ele tivesse seu valor literário.

    A partir daí todo o trabalho de Joe foi resultado do talento de Joan, que era a verdadeira autora dos livros que renderam anos de prestígio ao marido. Como ela “entendia” que nos anos 1960 o mercado editorial era dominado por homens, a mentira funcionava para os dois. Os flashbacks são até econômicos neste aspecto e, realmente, o filme não precisava se estender muito nisso. A bagagem do misto de orgulho e arrependimento estão expressas na atuação de Glenn Close em praticamente cada momento em que ela está em cena.

    Em meio à rotina que precede a premiação do Nobel, uma figura meio admiradora meio parasita surge para fervilhar ainda mais os pensamentos de Joan: Nathaniel Bone (Christian Slater), um escritor disposto a fazer uma biografia de Joe Castleman. Em busca de mais material interessante para o seu livro, ele chega muito perto de desvendar o segredo do aclamado escritor.

    A dinâmica do casal é um estudo incômodo e pertinente de como as coisas ainda funcionam para muitas famílias. Chega a ser até um pouco satírico se você parar pra pensar: a mulher que abriu mão de seu talento e de suas ambições para dar suporte ao marido e embarcar no sucesso dele. Mas, assim como a personagem de Glenn Close aprende, é um fardo que em determinado ponto fica pesado demais para carregar. O filme trata de um extremo – um Nobel que deveria ir para a esposa – mas ao nosso redor quantas mulheres você conhece que abriram mão de carreira, sonhos e ambições por causa de seus maridos? Quantas, apesar de todo o seu talento e potencial, acabaram se anulando pelo “bem” do casal ou da família?

    A esposa

    Eu sei que estou falando principalmente de Glenn Close aqui porque o filme é dela, não tem discussão (e me desculpem os little monsters, mas ela merece cada centímetro do Globo de Ouro que ela ganhou). Mas o Jonathan Pryce também oferece um contraponto interessante e muito bem executado como o marido que sabe que é uma farsa, mas que se acostumou tanto com a bajulação que não está disposto a abrir mão disso. Ele não nega e nem reconhece completamente o sacrifício da esposa.

    Como filme, o diretor Björn Runge abre mão de ambições cinematográficas para valorizar as cenas de diálogo e a excelente atuação do casal principal. Não precisava muito mais do que isso. O meu único porém é talvez a insistência no subplot do filho aspirante a escritor que busca a constante validação do pai. Não me levem a mal, o tema cai como uma luva na história, mas a jornada de Joan era tão mais interessante que às vezes a presença do filho era apenas uma distração impertinente.

    A esposa é um daqueles filmes que irá despertar uma familiaridade desconfortável em muitas pessoas que eu conheço. Glenn Close funciona como porta-voz de gerações de mulheres que se ocultaram em função do sucesso do marido ou até mesmo de filhos. É o filme perfeito para provocar tretas nas reuniões da maioria das famílias.

    Nota de A esposa:

    Glenn Close também está indicada ao SAG Awards por A esposa. Confira a lista completa de indicados.

    Imagens: © Meta Film London Ltd


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