O Matador | Será que a Netflix deu conta de um faroeste brasileiro?


     

    Não é segredo pra ninguém que ainda são poucos os acertos da Netflix quando o assunto é longa-metragem de ficção. Mesmo tendo isso em mente, a estreia de O Matador, primeiro filme de ficção brasileiro do serviço de setreaming, teve alguma expectativa, ainda mais com roteiro e direção de Marcelo Galvão, do simpático Colegas. Não demorou muito para o otimismo se derreter como um sorvete no calor do sertão nordestino.

    Dá pra perceber logo de cara que o filme tenta ser muitas coisas, mas, nessa tentativa, acaba se perdendo em uma trama esquizofrênica, com muitos personagens para pouco tempo, bons atores subaproveitados e uma montagem mal acabada. Resumindo: o filme é uma bagunça!

    Filme O Matador

    Começamos pela trama em que um homem está atravessando a mata com duas crianças e, ao se deparar com dois homens visivelmente perigosos, conta a história do tal do matador Cabeleira (Diogo Morgado). Beleza, esse recurso de história dentro de outra história é bem comum até, mas precisava deixar a primeira meia hora do filme completamente narrada e praticamente sem diálogos? Já cansa o expectador logo de cara. Afinal, até em livros, que possuem narrativa constante, existem diálogos para que as pessoas estejam inseridas na história. Demorou muito a acontecer isso.

    Cabeleira foi encontrado ainda bebê no meio do sertão pelo matador Sete Orelhas (Deto Montenegro) e é criado por ele. Quando Sete Orelhas sai um dia e não retorna, Cabeleira decide ir atrás dele. Chegando à cidade, ele é contratado de uma forma bem abrupta e aleatória pelo tal do francês Monsieur Blanchart (Etienne Chicot), que utiliza seus matadores para conseguir terras pelo sertão e explorar pedras preciosas da região.

     

     

    Aí quando a gente começa a entrar nessa história, eles decidem parar tudo pra mostrar uma outra subtrama no sertão, agora com o oficial da lei Quatro Olhos (Marat Descartes), só pra mostrar que já havia corrupção policial naquela época (Capitão Nascimento aprova). É sério, são uns bons minutos em que o filme parece se esquecer da história de Cabeleira. Lá na frente essas tramas irão se encontrar, mas para um filme tão curto, a montagem ficou estranha e bagunçada. São muitos “protagonistas” disputando o holofote, o que não dá tempo pra criar empatia com nenhum deles.

    Aliás, falta empatia até com o nosso protagonista-alfa Cabeleira. Beleza que as figuras de “homens fortes” de faroestes geralmente são dúbias, mais apelando para anti-heróis do que para aqueles mocinhos que fazem tudo certo. Mas todo mundo que já viu pelo menos um filme do Clint Eastwood ou do John Wayne consegue desvendar uma ou outra camada do personagem e torcer por ele. Com Cabeleira isso não acontece, nós não sabemos o que norteia suas ações e por que deveríamos torcer por ele. Afinal, ele é um matador contratado por um senhor de terras e o fato de ele “não matar mulheres e crianças”, além de ser bem clichê, não é justificado. Fica só por isso. Eles querem que eu torça por esse cara só por isso?

    Motivação de personagem é uma coisa que a gente praticamente não vê aqui. Todos eles são apenas figuras caricatas que agem tão somente com base no clichê que representam. O francês mata qualquer um que esteja no seu caminho simplesmente porque ele é mau. A esposa tem atividades subversivas na cidade, mas pra que serve isso na história mesmo? O filho deles é a versão mais horrorosa que vocês verão de bicha má (mais pela má atuação e caracterização, apesar do personagem também ser um sádico). É triste de ver.

    Sem contar que ao longo da trama vão pipocando novos personagens que parecem prometer muito, mas cumprem pouco. As primas de Quatro Olhos só aparecem pra sofrer e mostrar como a vida era injusta com as mulheres no sertão (acho que era isso). Aí um cara que teve a casa queimada busca vingança pelo que o francês fez com a família dele, mas a gente também não sabe muito sobre ele. Aí quando o filme está quase acabando aparece o tal do gringo, um caubói norte-americano tão clichê que parece ter saído de um comercial de Marlboro ou de alguma atração do Beto Carrero. Uma sátira de filmes de faroeste teria sido mais honesta.

    Filme O Matador

    Pra não dizer que o filme só tem coisa ruim, há algumas tomadas de fotografia bem interessante, mas elas se perdem em meio ao filme. A produção apela pra um CGI bem medonho em alguns momentos que você fica distraído com isso e nem presta tanta atenção na história. Os enquadramentos e a edição dos diálogos lembram algo que se vê em novela, e não em filmes. Sem contar que a má atuação da maioria do elenco também não ajuda em nada. Ah! E se você tiver alguma desconfiança bem previsível quanto ao final do filme, é bem provável que você esteja certo.

    Enfim, o primeiro longa brasileiro da Netflix é uma bagunça muito grande que não valoriza nem a história do sertão, nem o cinema e nem o elenco que eles chamaram para participar. Se você quiser ver algo com esta temática, procure o filme Entre irmãs, que não é um faroeste, mas é um épico com uma produção bem mais caprichada, com uma ambientação mais crível e uma história realmente envolvente. Não foi dessa vez, Netflix.

    Nota:

    Trailer de O Matador

    https://www.youtube.com/watch?v=9O1eQaMyZvs

    Imagens: Netflix

     


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