Histórias de amadurecimento entre a adolescência e a fase adulta não são novidade, ainda assim, Lady Bird consegue fazer uma leitura realista e com poucas romantizações desta fase da vida de uma adolescente que está prestes a entrar na faculdade. O roteiro e direção são de Greta Gerwig, que também é atriz e tem neste filme quase que uma autobiografia.
A história é sobre Christine “Lady Bird” (Saoirse Ronan), uma garota que está no último ano do ensino médio em uma escola católica da cidade de Sacramento. Ela tem uma inquietação que a faz “odiar” a cidade em que vive e sonhar com um futuro cheio de aventuras e realizações do outro lado do país, provavelmente em Nova York.
Além disso, ela tem uma relação extremamente conturbada com a mãe (Laurie Metclaf) e passa por experiências que são bem típicas desta fase da vida: o primeiro namorado, a primeira decepção amorosa, a primeira relação sexual, a melhor amiga e uma tendência à transgressão. É tudo bem familiar pra todo mundo que já foi adolescente, mas a forma com que o roteiro apresenta tudo isso tem uma originalidade que nos convence de que aquelas pessoas e situações são reais.
Uma das primeiras coisas que me chamou atenção foi a quebra de alguns paradoxos ao longo do filme: a nossa heroína faz um monte de coisa que nós não aprovamos, a mãe dela é “assustadora e carinhosa”, o pai que parece super amoroso tem lá seus problemas, o irmão que frequentou uma boa faculdade mas trabalha como caixa de supermercado e a garota popular que está bem longe do grupinho de Meninas Malvadas, por exemplo. Embora nenhum destes personagens tenha o aprofundamento dado à Lady Bird, é um alívio ver esta tentativa de se aproximar da realidade, de não ter estereótipos tão claros e deixar o público realmente na dúvida se ama ou odeia determinado personagem.
Outro ponto que ajuda muito nesta originalidade são os diálogos, principalmente entre Lady Bird e sua mãe. A mudança de rumo que certas conversas tomam, passando de um momento de cumplicidade para uma discussão catastrófica é o que te mantém muito mais ligado no que está acontecendo. Da mesma forma, os diálogos são muito verdadeiros: não há uma preocupação em descascar frases de efeito ou de todo mundo sempre ter a melhor resposta na ponta da língua. Não parece roteirizado ou ensaiado e é muito provável que te lembre de discussões que você já teve com os seus pais.
Apesar da vida de Lady Bird não parecer nem de longe perfeita, o filme tem um humor muito bem-vindo, ora pelas situações criadas pelo roteiro, ora pela nossa própria lembrança de como adolescentes podem ser dramáticos. Tem uma cena em que o padre que dirige o grupo de teatro é substituído que é uma das minhas preferidas.
Saoirse Ronan, apesar de ser mais velha que a personagem, consegue convencer como adolescente inquieta. Não me parece ser o papel que mais exigiu dela, mas ainda é um ótimo trabalho que merece a sua atenção. Mesmo com menos tempo de tela, Laurie Metclaf consegue se sobressair com a complexidade que a personagem dela exige: uma mãe que quer o melhor para a sua filha, mas que ao mesmo tempo carrega as frustrações de ser chefe de uma família com problemas financeiros e não consegue evitar o embate com a adolescente.
Mesmo com poucas chances de levar Oscars nas cinco categorias em que está indicado, Lady Bird tem uma mensagem bacana não apenas sobre o amadurecimento da personagem, mas sobre vidas imperfeitas, sororidade, a ilusão de que mudar de lugar resolverá magicamente todos os seus problemas, relações complicadas mas nem por isso sem amor e de como a relação com o lugar em que você mora define quem você é. Sim, tudo isso num filme cuja protagonista é uma adolescente que tem um objetivo muito maior do que encontrar um namorado.
Nota:
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